A CONCEPTUALIZAÇÃO D0 EXERCÍCIO DE TREINO DE FORMA A POTENCIAR O DESEMVOLVIMENTO DO JOVEM ATLETA

Penso que todos concordam que quanto mais tempo um jogador mantém-se em exercício durante as sessões de treino, maior a probabilidade tem de aprender e desenvolver as diferentes dimensões do jogo de futebol ao nível: tático, físico, técnico, cognitivo e psicológico.

A repetição sistemática é importante, pois, segundo alguns estudos, quanto mais tempo o atleta manter-se em exercício, maior a probabilidade de atingir o objetivo proposto pelo exercício - Tempo Potencial de Aprendizagem (o tempo que o atleta mantém-se ocupado, com elevado grau de sucesso – 80% - em exercícios diretamente relacionados com os objetivos de aprendizagem).

Para além do benefício de aprender o jogo, existem outros benefícios associados ao tempo de prática por parte dos jogadores, nomeadamente:

Mentais – quando os jogadores ficam demasiado tempo à espera, os índices de concentração baixam, surgem os comportamentos desviantes (brincadeiras sobretudo nos escalões mais jovens) e pode também surgir a desmotivação. Logo os índices de aprendizagem e desenvolvimento são menores;

Saúde – em Portugal a esmagadora maioria dos treinos decorrem à noite, com temperaturas baixas, sobretudo no Inverno. Caso os jogadores não estejam constantemente em movimento, arrefecem podendo surgir as gripes e constipações.

Em Portugal, a esmagadora maioria dos clubes (nomeadamente amadores e escalões jovens) treinam entre 2 a 3 vezes por semana. Por norma, cada treino tem a duração de 45 a 90 minutos (dependendo do escalão).

Tomando como exemplo uma sessão de treino de 90 minutos. Se consideramos que destes 90 minutos, temos que retirar o tempo:

- Parte Introdutória – Palestra – entre 3 a 5 minutos;

- Parte Preparatória e Principal - Explicação dos exercícios, transições entre exercícios, no montar/desmontar dos exercícios, pausa para a água, fazer equipas… - cerca de 10 minutos;

- Parte Final – Retorno à Calma – entre 5 a 10 minutos;

Todas estas pequenas pausas, podem chegar a um total de 25 minutos a menos da duração do treino, ou seja os atletas acabam por estar em exercício entre 65 a 72 minutos (dependendo da dinâmica das sessões de treino).

O tempo da Parte Introdutória (aquecimento), está englobado no Tempo Especifico de Treino, pois nesta parte da sessão de treino pode-se iniciar logo com exercícios que vão de encontro ao objectivo da sessão. Caso o treinador opte por outros tipos de exercício que não vão ao encontro do objectivo da sessão de treino, significa que o tempo de prática específica dos atletas será ainda menor.

Na tabela seguinte apresento valores aproximados dos tempos específicos de treino para sessões de treino de diferentes durações.

Duração da Sessão de Treino (minutos)	Tempo Perdido (minutos)	Tempo Específico de treino (minutos)	Tempo Perdido de Treino (%)
90*	Até 25	A partir de 65	Até 28%
60**	Até 20	A partir de 40	Até 33%
45***	Até 18	A partir de 27	Até 40%

* Para as Sessões de Treino de 90 minutos considerei o tempo máximo da Parte Introdutória e Final

**Para as Sessões de Treino de 60 minutos considerei a média do tempo mínimo e máximo da Parte Introdutória e Final

*** Para as Sessões de Treino de 45 minutos considerei o tempo mínimo da Parte Introdutória e Final

Rapidamente constatamos que quanto menor for a duração do treino, menor será o tempo específico do treino.

Podemos igualmente constatar que uma equipa que treine 3 vezes por semana, pode até perder o tempo equivalente a um dia de treino devido às pausas, como podemos observar na tabela seguinte:

Duração do Treino (minutos)	Duração Total do Microciclo (minutos)	Tempo Total Perdido no Microciclo (minutos)	Tempo Específico de Treino no Microciclo (minutos)
90	270	Até 75	A partir de 195
60	180	Até 60	A partir de 120
45	135	Até 54	A partir de 81

Portanto é de extrema importância que o treinador durante a planificação da sessão de treino, tenha em atenção a organização do mesmo nomeadamente na escolha e forma como os exercícios irão decorrer, de modo a que a sessão de treino seja dinâmica o mais possível e com poucos tempos de pausa.

Em exercícios competitivos (jogos reduzidos, ou jogos condicionados ou jogos lúdicos) por norma não existem jogadores em espera, no entanto, em exercícios analíticos e sobretudo naqueles em que só executa um jogador de cada vez, os outros atletas têm que ficar em espera a aguardar para executar o exercício.

Analisemos a tabela seguinte tendo em conta o número de atletas em fila:

Nº de Jogadores em fila	Tempo em exercício	Tempo em Espera
3	1/3	2/3
4	1/4	3/4
5	1/5	4/5
6	1/6	5/6

O que significa, em termos práticos, esta tabela?

Para melhor entenderem, vou dar como exemplo, 1 exercício analítico de finalização com duração total de 10 minutos, 8 jogadores (6 de campo e 2 guarda-redes), sendo que cada jogador de campo demora cerca de 10 segundos a executar o mesmo:

Número de repetições	Tempo de Prática	Tempo de Espera
	3 jogadores em fila
20 repetições	3m e 20s	6m e 40s
	4 jogadores em fila
15 repetições	2m30s	7m30s
	5 jogadores em fila
12 repetições	2m	8m
	6 jogadores em fila
10 repetições	1m40s	8m20s

*Nota – o tempo de espera contempla não só o tempo em que o jogador encontra-se em espera na fila, mas também o tempo que demora desde que termina o exercício até voltar à fila.

Deste exemplo, podemos concluir que quanto menor for a fila, mais repetições o atleta executa o exercício.

Nesse sentido é necessário utilizar algumas estratégias, para contrapor os tempos prolongados de pausa. Em baixo, apresento algumas sugestões para o treinador aumentar o tempo de prática dos jogadores, mantendo o exercício e o tempo do mesmo, descrito em cima:

- mantém o exercício, mas divide os atletas em 2 grupos de 3, realizando o mesmo exercício durante os 10 minutos;

- se o treinador definir que 10 repetições por jogador é o suficiente, reduz o tempo para 5 minutos, permitindo:

• dividir os atletas em 2 grupos de 3, realizando o mesmo exercício. Esta opção dá ao treinador a possibilidade de planear mais exercícios para a sessão de treino, ou aumentar o tempo de outros exercícios;

• dividir os atletas em 2 grupos de 3, realizando 2 exercícios analíticos individuais diferentes. Ao fim dos 5 minutos, trocam de exercício;

• dividir os atletas em 2 grupos de 3, realizando 2 exercícios analíticos diferentes, sendo que o 2º exercício é coletivo (por exemplo 2vs1+Gr). Esta opção dá a possibilidade de reduzir o tempo de pausa, no total dos 2 exercícios, visto que no exercício coletivo, estão constantemente em ação;

Ainda dentro deste exercício, existe a possibilidade de o Treinador não definir o tempo do mesmo, mas sim o número de repetições por jogador. Poderá dividir os atletas em 2 grupos: 1 grupo de 4 jogadores e outro de 2 jogadores. O grupo de 2 jogadores realizam 10 repetições enquanto o grupo de 4 jogadores realiza um exercício competitivo de jogo reduzido (por exemplo 2vs2). Quando o grupo de 2 jogadores termina as 10 repetições, troca com uma das equipas do jogo reduzido.

Nesta sugestão o tempo do exercício deverá ultrapassar os 10 minutos, mas o tempo de pausa dos atletas será menor.

Convém não esquecer:

• Descrevi apenas as alternativas de exercício para os jogadores de campo, no entanto, neste exercício também estão envolvidos os 2 guarda-redes. Nestes exemplos, a situação dos guarda-redes foi simples de resolver pois ou iam-se revezando quando só existia uma baliza, ou então ficava 1 guarda-redes em cada baliza quando existia finalização para 2 balizas. Mas há que ter em atenção que muitas vezes os guarda-redes são incluídos em exercícios que devido a vários factores, como por exemplo: complexidade do exercício, qualidade técnica dos jogadores… que acabam por ter uma pouca participação no exercício, passando muito tempo parado.

• Apresentei alguns exemplos de exercícios a desenvolver, a partir de um exercício de finalização, para que os atletas estejam o máximo possível em ação. No entanto, o treinador pode criar outro tipo de exercícios, como por exemplo posse de bola, exercício de passe e condução…, tudo dependerá dos objectivos que tem definidos para aquela sessão de treino.

• O treinador deve ter sempre em conta fatores que possam ser limitantes à aplicação de determinado(s) exercício(s): espaço disponível para treinar, material disponível de treino, orientação dos exercícios, espaço ocupado pelos exercícios, Grau de dificuldade do(s) exercício(s), escalão que está a treinar, qualidade técnico-tática dos seus jogadores, nº de jogadores de campo e de guarda-redes presentes no treino, objetivo das capacidades físicas a desenvolver no exercício.

Caso não seja possível adaptar-se um exercício devido a estes fatores enumerados (ou outros), então deve-se escolher outro exercício de modo a não sujeitar os atletas a longos tempos de espera.

Não se esqueça que pode sempre optar (sobretudo nos escalões mais jovens) pelo exercício que todos gostam, independentemente da idade, o Jogo.