Nota introdutória: No âmbito da cadeira de Metodologia do Treino, fui contactado por um aluno do ISCE, para uma entrevista sobre a importância do Treinador Adjunto. Após ter lido a entrevista decidi escrever um artigo sobre o tema, sendo que as linhas que se seguem têm por base a entrevista, que por sua vez, tem a ver com as experiências que já vivenciei.
Muitos treinadores que andam pelo futebol, têm a ambição de chegar ao topo do futebol. Afinal se estão a despender do seu tempo no desporto que amam, é uma ambição legítima quererem chegar o mais alto possível. Engane-se quem pensa que apenas se pode fazer carreira ao mais alto nível, enquanto treinador principal. Rui Faria (adjunto de longa data de Mourinho) é um excelente exemplo, de que um treinador adjunto pode igualmente fazer carreira ao mais alto nível. Independentemente de se chegar ao topo como treinador principal ou adjunto, ou mesmo não conseguir nunca chegar ao mais alto nível, considero ser importante que uma das fases da evolução de qualquer treinador seja passar pela experiência de adjunto. Ao longo da minha “carreira”, já passei por essa experiência (mais que uma vez) e considero que foi bastante enriquecedora, porque acabei por aprender muito com os treinadores principais. As experiências que tive enquanto adjunto foram muito boas porque tanto aprendi o que devo fazer, mas sobretudo o que não devo fazer. Com estas experiências acabei por criar as minhas próprias ideias de como devo agir: enquanto treinador principal e perante a minha equipa técnica.
Quando assumo uma equipa enquanto treinador principal, gosto que os meus adjuntos saibam que são parte ativa do projeto e uma mais-valia para a equipa. Nesse sentido dou-lhes total liberdade e responsabilidade para poderem desempenhar as suas funções. As suas principais funções passam por ajudar-me: na escolha de jogadores para construir a equipa; no planeamento da época desportiva; na construção do Modelo de Jogo; na planificação e operacionalização das sessões de treino; na convocatória para os jogos, na observação dos adversários, substituir-me quando qualquer motivo não posso estar presente num treino ou jogo e outras situações que considere que seja necessário as suas intervenções. Nesse sentido, as principais competências e qualidades que deverão possuir são: capacidade de liderança e comunicação, e conhecimento técnico (entenda-se conhecimento técnico com tudo o que está relacionado com o Futebol). O elo mais importante que deve existir entre o treinador principal e os seus adjuntos é a confiança. O conhecimento no Futebol é muito vasto, logo a forma como eu vejo o Futebol poderá ser diferente da dos meus adjuntos. Nesse sentido, eu gosto que os meus adjuntos não estejam sempre em concordância comigo, pois não tenho o dom da razão e do conhecimento. Eu quero adjuntos que exponham as suas ideias/pontos de vista quando acham que eu não tenho razão sobre determinado assunto, que apresentem soluções aos problemas que vão surgindo, que proponham outros caminhos para alcançarmos os nossos objetivos. Aliás, vou até mais longe afirmando que todas as decisões sobre qualquer matéria devem ser decididas entre todos os membros da equipa técnica. O treinador que não o faz, na minha ótica está errado, não fazendo sentido ter equipa técnica. Não é à toa que uma das minhas máximas é exatamente o “debater/discutir futebol para podermos evoluir enquanto treinadores”. Outros elos, que considero igualmente importantes para a relação entre os membros da equipa técnica são: a cumplicidade, a honestidade, a fidelidade e a sinceridade.
Nesta linha de raciocínio, sou contra a imposição de treinadores adjuntos por parte das Direções dos Clubes. Infelizmente passei por uma situação destas, em que foi-me imposto uma equipa técnica. Os elos não foram criados nomeadamente com o Treinador Adjunto. Embora eu tenha dado toda a liberdade e responsabilidades para desenvolver as suas funções, os resultados não apareceram, surgiram conflitos e então acabei por ser dispensado. Por um lado acabou por ser uma experiência negativa, mas por outro lado uma grande aprendizagem para o futuro. Portanto reforço a ideia de que não sou apologista de me indicarem um treinador. Se um clube assim me exigir, eu apenas aceito ficar no mesmo se os restantes elementos da equipa técnica forem escolhidos por mim.
Quanto à relação com os jogadores, pela experiência que já passei como adjunto e agora como principal, reparo que os jogadores têm uma maior facilidade em abordar os treinadores adjuntos do que os treinadores principais, pois temem que possam ser castigados. Embora eu esteja constantemente a dizer que estão à vontade para expressar as suas opiniões, noto que recorrem muito mais vezes aos meus adjuntos. Para terminar deixo esta frase para reflexão cujo autor desconheço: “Nem todos os bons treinadores adjuntos serão necessariamente bons principais, nem todos os principais poderão ser bons adjuntos”
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